É de primeira qualidade o livro A fórmula da emoção na fotografia de guerra, de Leão Serva. O mérito do livro se expressa, antes de tudo, na atualidade e originalidade com que trata o tema das fotografias de guerra. A atualidade se deve ao escrupuloso estudo, realizado pelo autor, da obra de Aby Warburg, pensador que introduziu uma ruptura significativa nos tradicionais métodos de tratamento histórico das imagens, e cuja obra vem sendo reivindicada pelos mais importantes teóricos e filósofos da imagem na contemporaneidade, como é o caso de Didi-Huberman. Rompendo com a visão cronológica da história da arte e tomando o Renascimento como ponto privilegiado de observação, Warburg passou a colecionar imagens e justapô-las a partir da percepção daquilo que chamou de Pathosformel, quer dizer, a expressão imagética de “fórmulas de pathos" da agitação passional, da vida em seu movimento, ou seja, modelos de gestualidades intensificadas, passíveis de reconhecimento pelo observador. Para Warburg, essas fórmulas são reconhecíveis porque sobrevivem na memória dos povos. Essas imagens analisadas foram agrupadas por Warburg em painéis, cada um deles composto por cenas que repetem a mesma “formula da paixão", no seu famoso Atlas mnemosine. A originalidade do trabalho de Serva encontra se na sua transposição, sob o título de “formula da emoção", da inusitada metodologia warburguiana para o tratamento das imagens de guerra. Esse tratamento e antecedido por uma sucinta história da fotografia e sua incorporação de alguns princípios pictóricos, seguida por um breve retrospecto da fotografia de guerra e suas relações com os dispositivos técnicos presentes em cada momento histórico. Na sequência, Serva mergulha na vida e na obra de Warburg, com fidelidade cuidadosa aos conceitos desse pensador, inclusive trazendo para análise alguns dos painéis do Atlas. Em seguida, grandes temas de guerra, tais como rostos, decapitação, corpos em chamas etc. são interpretados com apuro de tratamento das fontes, ao lado de reproduções de imagens correlatas. Os discursos descritivos e analíticos são mesclados por Serva com admirável competência, aliás, uma competência discursiva e uma precisa habilidade de condução do fio do raciocínio e argumento que marcam o livro como um todo. Muito tem se falado sobre Warburg nos últimos anos em nossos meios acadêmicos, mas, de que tenho notícia, nenhum trabalho levou a pesquisa e o entendimento da obra desse pensador tão longe quanto Serva. Para completar, seu livro não se detém apenas na interpretação conceitual e na descrição metodológica, mas as coloca a prova da experiência na sua escolha certeira de imagens de guerra que se prestam à perfeição da análise da “fórmula da emoção". Lucia Santaella